Hoje trago uma reflexão que reúne comentário,
crítica, sugestão e análise sobre a forma como nossa cidade vem sendo
administrada ao longo dos anos. É uma tentativa simples de manifestar aquilo
que muitos cidadãos percebem, mas poucos expressam com clareza: a sensação de
que os mandatos passam, mas os problemas permanecem.
Há muito tempo nossa cidade elege prefeitos e
mais prefeitos — cada um com sua aparência, seu caráter, seus desejos e suas
ambições. Alguns chegam com vontade de trabalhar, deixam obras e resultados que
melhoram a vida das pessoas. Conheci alguns assim, que realmente mostraram
serviço. No entanto, há também os que nada fazem de útil: assumem o cargo
apenas para garantir um bom salário, desfrutar do poder e, muitas vezes,
destruir o que outros fizeram antes. Há ainda os que vencem a eleição, festejam
e somem, esquecendo completamente dos bairros que prometeram visitar. Durante a
campanha, correm de casa em casa atrás de voto; depois de eleitos, desaparecem.
Prometem planos e projetos para tudo — saúde,
educação, infraestrutura, lazer — mas, uma vez no poder, os planos ficam à
deriva. São tantos cargos de confiança distribuídos por favores políticos que,
ao final, muitos gestores nem sabem para que servem. É o velho jogo do poder:
garantir influência e aliados, em vez de garantir resultados. Em muitos casos,
fazem acordos políticos tão amplos quanto o inferno, que depois não conseguem
cumprir. O povo, por sua vez, precisa parar de agir como mero espectador. Deve
compreender, de forma legal e consciente, que se um prefeito não cumpre sua
função de melhorar a vida do cidadão, não deve continuar. O voto precisa deixar
de ser um cheque em branco.
Há quem diga que o problema está nos partidos.
Seria o partido o culpado pela má administração? A resposta é não. No Brasil,
segundo entendimento predominante da Justiça Eleitoral, o mandato dos cargos
majoritários — como prefeitos, vice-prefeitos, governadores, presidentes e
senadores — é pessoal, ou seja, pertence ao eleito, e não ao partido. Isso
significa que o prefeito pode trocar de partido a qualquer momento, inclusive
logo após vencer a eleição, sem perder o mandato. Já a regra da fidelidade partidária,
que pode levar à perda do cargo, vale apenas para cargos proporcionais — como
vereadores e deputados — porque, nesses casos, a vaga pertence ao partido, e
não ao indivíduo. Assim, o povo precisa compreender que o prefeito é “dono” do
próprio mandato. Ele usa o partido como plataforma para se eleger, e depois,
muitas vezes, o abandona. Portanto, a culpa não está necessariamente nos
partidos, mas nas pessoas que os representam e nas escolhas que o eleitor faz.
Voltando à nossa cidade, é inegável que alguns
prefeitos deixaram marcas positivas: obras públicas, limpeza urbana, reformas,
ou pequenas melhorias que trouxeram dignidade a certas áreas. Porém, outros
nada fizeram — ou pior, causaram retrocessos. Um exemplo é a destruição das
árvores das ruas e praças. Em vez de preservar ou replantar, preferiram cortar
e queimar em olarias, ignorando completamente a importância ambiental dessas
árvores. Se ao menos tivessem o cuidado de analisar o estado das árvores, poderiam
substituir as doentes e manter o equilíbrio ecológico. Mas não: o que
prevaleceu foi o descuido e o improviso. A cidade perde beleza, sombra e
qualidade do ar — e o povo perde o direito a um ambiente saudável.
Essas atitudes refletem uma forma de governar
baseada na pressa e na falta de planejamento. Muitos projetos são iniciados sem
estudo técnico, sem análise de impacto, sem considerar o custo-benefício.
Destrói-se algo antes mesmo de pensar no que será colocado no lugar. Resultado:
desperdício de dinheiro público e obras que não resolvem o problema nem no
presente, nem no futuro. O correto seria realizar diagnósticos sérios,
consultas públicas e análises ambientais e urbanísticas antes de mexer no que
existe. Assim se evita o desperdício e se constrói com responsabilidade.
Cabe ao cidadão compreender que a
responsabilidade de mudar essa realidade é coletiva. É dever do povo acompanhar
de perto as ações da administração pública, fiscalizar gastos e exigir
transparência. Cada cidadão pode e deve observar o que acontece em seu bairro,
cobrar explicações, participar de audiências públicas, acompanhar portais da
transparência e denunciar irregularidades quando necessário. O poder público só
funciona plenamente quando o povo deixa de ser passivo e se torna vigilante.
A Justiça Eleitoral, em várias decisões,
reforça que a infidelidade partidária não afeta o mandato de cargos
majoritários, justamente porque o voto é dado à pessoa e não ao partido. No
entanto, essa autonomia traz uma responsabilidade maior: o prefeito que se
elege com o apoio de uma sigla, de uma bandeira e de um discurso, deve honrar a
confiança depositada pelo povo — e não a usar apenas como degrau para
benefícios pessoais. É essa falta de compromisso ético que corrói a política
municipal.
Infelizmente, ainda vemos atitudes
administrativas pautadas pela vaidade, pela pressa e pela troca de favores. E o
mais grave: destrói-se o que foi feito antes apenas para “mostrar serviço” e
serviço ruim. Sem um estudo profundo, sem um planejamento sério, sem visão de
longo prazo, as gestões passam, os erros se repetem, e o progresso se atrasa.
Um livro de mil páginas seria pouco para relatar tudo que já foi feito errado
em nome da vaidade política.
Por tudo isso, o cidadão precisa aprender a
votar com consciência e acompanhar quem elege. Fiscalizar é um ato de amor à
cidade. O poder pertence ao povo, e não aos políticos. E enquanto o povo não
compreender isso, continuará sendo usado como escada para os interesses de quem
só pensa em si mesmo. É preciso romper esse ciclo — exigindo seriedade,
planejamento e respeito por aquilo que é público. Afinal, governar é servir,
não se servir.
Um exemplo aparentemente simples, mas que
revela um erro grave e absurdo, foi o entupimento de córregos com tubos de
latão. Essa solução, além de tecnicamente equivocada, mostrou-se totalmente
ineficiente com o passar do tempo. O latão, por ser um metal sujeito à
corrosão, apodrece tanto por cima quanto por baixo, causando infiltrações e
desmoronamentos. O resultado é previsível: com o tempo, o solo cede, o leito do
córrego se deforma e os alagamentos aumentam. A solução correta seria reabrir
os córregos, devolvendo-lhes o curso natural, como era no passado. As
chuvas — cada vez mais intensas e imprevisíveis — precisam de espaço para
escoar. Canalizar com materiais frágeis e de baixa durabilidade é apenas adiar
um problema que cresce a cada ano. Em vez de “tampar a ferida”, seria melhor
permitir que a natureza trabalhasse como sempre fez, com canais abertos,
vegetação nas margens e drenagem adequada.
Outro equívoco recorrente é a falta de planejamento
no trânsito urbano. A cidade continua com as mesmas ruas estreitas e mal
dimensionadas desde sua criação, mas o número de veículos multiplicou-se. O
resultado é um trânsito caótico. Não existe milagre para resolver isso, apenas organização
e disciplina. Uma das saídas mais práticas seria implantar mão única
em ruas de maior movimento, controlar rigorosamente a velocidade e reforçar a
sinalização com faixas, placas, semáforos e lombadas. Além disso, o uso de
placas de “PARE” e outra em praticamente todas as esquinas aumentaria a
segurança e reduziria acidentes. Quem não quiser respeitar regras e limites de
velocidade, que deixe seu automóvel na garagem. O trânsito melhora com
responsabilidade coletiva, e não com a ilusão de que basta “abrir mais ruas” ou
“construir mais estacionamentos”. O problema é cultural: todos querem ter seu
carro e circular ao mesmo tempo, sem pensar nas consequências.
Mais grave ainda é a obsessão pelo
“progresso” a qualquer custo, que leva muitos gestores a destruir o que tem
valor histórico, cultural e ambiental. É um erro inaceitável demolir estruturas
centenárias — como praças, jardins ou casarões,— para dar lugar a vagas de
estacionamento. Isso não é progresso, é retrocesso disfarçado de modernização.
Antes de destruir, é preciso analisar profundamente o impacto da
intervenção e buscar alternativas inteligentes para resolver o problema sem
apagar a história da cidade.
Em grande parte, o caos urbano não é
causado pelos visitantes ou turistas, mas pelos próprios moradores —
especialmente profissionais como comerciantes, médicos, advogados e
funcionários de escritórios — que chegam pela manhã, estacionam seus carros e
os deixam ali o dia inteiro. Muitos desses trabalhadores moram a menos de 200
metros do local de trabalho, mas insistem em ir de carro, ocupando vagas que
poderiam servir para quem realmente precisa, como pessoas de outras cidades ou
clientes de passagem.
Uma das soluções mais inteligentes e
sustentáveis para reduzir o caos é o fortalecimento do transporte coletivo,
especialmente o sistema de ônibus municipais. Em vez de incentivar o uso
individual do automóvel, que ocupa muito espaço e transporta poucas pessoas, as
cidades deveriam investir em transporte público de qualidade, eficiente
e acessível.
O problema é que, na maioria das cidades
pequenas e médias, o transporte coletivo é visto como um “mal necessário”, e
não como parte da solução. Uma gestão responsável deveria encarar o
transporte coletivo como prioridade. Um bom sistema de ônibus pode tirar
centenas de carros das ruas diariamente. Para isso, é preciso um conjunto de
medidas práticas.
Esses hábitos individuais de cada um geram
impactos coletivos: aumentam o congestionamento, dificultam o estacionamento e
poluem o ambiente. Bastaria que cada um refletisse um pouco e deixasse o carro
em casa quando possível. Caminhar curtas distâncias traria benefícios à saúde,
ao trânsito e ao clima. Mas, infelizmente, prevalece a vaidade — a necessidade
de “mostrar o possante” — e a cidade paga o preço disso.
Existem soluções simples e eficazes para essa
questão. Uma delas seria a implantação de áreas de estacionamento rotativo,
como a “zona azul”, onde o motorista paga pelo tempo de uso da vaga.
Isso inibiria o uso prolongado e obrigaria os ocupantes fixos a repensarem seus
hábitos. Outra alternativa seria criar estacionamentos mensais pagos, próximos
às áreas comerciais, para profissionais que realmente precisam deixar o carro
por mais tempo. Com essas medidas, haveria melhor aproveitamento dos espaços
e, ao mesmo tempo, menos destruição. De nada adianta derrubar praças e
árvores para criar novas vagas, pois o ganho seria mínimo — talvez 50% de
aumento — e ainda assim às custas da perda do verde, da história e da qualidade
de vida.
Pesquisas urbanas mostram que cerca de 70%
dos motoristas que circulam diariamente pelas cidades moram a menos de um
quilômetro do trabalho. Isso significa que boa parte dos congestionamentos
e da falta de vagas é causada pelo uso desnecessário do automóvel. Se esses
cidadãos deixassem seus veículos em casa, estariam fazendo um bem duplo: ao
próximo, que precisa estacionar; e a si mesmos, pela atividade
física e o bem-estar que a caminhada proporciona.
Como disse antes, eu poderia escrever um livro
inteiro relatando tantos absurdos cometidos em nome do progresso. Falta
sensatez, planejamento e amor pela cidade. Tudo isso que comento aqui é, ao
mesmo tempo, crítica, sugestão e alerta. Governar exige equilíbrio entre
crescimento e preservação — entre o moderno e o histórico, entre o concreto e o
humano. Infelizmente, muitos dos que tomam decisões públicas destroem com as
próprias mãos o que a humanidade construiu com esforço e tempo — e ainda
acreditam que estão fazendo o bem. Isso é a verdadeira hipocrisia.
O verdadeiro progresso não se mede por quantas
árvores foram cortadas, quantas praças foram cimentadas ou quantos carros cabem
no centro da cidade. Mede-se pela qualidade de vida, pela beleza preservada
e pela harmonia entre pessoas e natureza. Enquanto o ser humano não
entender isso, continuará cavando o próprio buraco — debaixo do pretexto de
estar “evoluindo”.
Para encerrar está reflexão, deixo uma
orientação que serve como convite à consciência coletiva: a cidade é o
espelho fiel de seus habitantes. Nenhum prefeito, governador ou
administrador é capaz de transformar uma cidade sozinho, porque o verdadeiro
progresso começa na base — na conduta de cada cidadão. De nada adianta exigir
honestidade, se o próprio povo se cala diante do errado. De nada adianta cobrar
limpeza, se continuamos jogando lixo nas ruas. E tampouco adianta pedir
trânsito organizado, se cada um quer ter o privilégio de dirigir sem respeitar
regras, sem paciência, sem gentileza.
Cada cidadão é uma peça essencial do todo
urbano. O trânsito, as praças, os córregos, as árvores, — tudo isso forma um
organismo vivo que precisa de cuidado e respeito. Quando cortamos uma árvore à
toa, quando entupimos um córrego, quando destruímos um patrimônio histórico,
não estamos apenas alterando o espaço físico, estamos ferindo a própria
identidade da cidade. E quando o morador aceita calado, contribui com o
mesmo erro.
O progresso verdadeiro não nasce do cimento nem
do asfalto. Ele floresce da consciência, da educação, da empatia e da
responsabilidade. A cidade precisa de líderes que planejem com sabedoria, mas
também de cidadãos que participem, fiscalizem e colaborem, principalmente
os vereadores, que também não agem em nada. É preciso aprender a votar com
razão e não por emoção, a acompanhar as obras e gastos públicos, e a entender
que cobrar é um dever, não um favor.
Se quisermos um futuro melhor, devemos substituir
a pressa pela reflexão, o descuido pela prevenção e a indiferença pelo
envolvimento. Deixar o carro em casa quando possível, andar a pé, usar o
transporte público, preservar o verde, respeitar a história e valorizar o que
já existe são atitudes simples, mas poderosas.
Uma cidade só evolui quando seu povo amadurece.
E amadurecer significa compreender que progresso não é barulho, destruição e
vaidade — é equilíbrio, respeito e convivência harmoniosa. Quando cada
um fizer a sua parte, as ruas serão mais humanas, os rios voltarão a respirar,
e o espaço urbano deixará de ser um campo de disputa para se tornar um lugar de
convivência, orgulho e esperança.
Porque, no fim das contas, o futuro da cidade não
está nas mãos de quem governa, mas no coração de quem nela vive.
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