Desde que me entendo por ser
humano, observo que, em minha cidade, muitas coisas curiosas — e até mesmo
inusitadas — aconteceram ao longo dos anos. A administração municipal, em
diferentes gestões, sempre buscou deixar sua marca na história, seja por obras
de grande impacto, seja por iniciativas que transformaram o dia a dia da
comunidade ou mesmo por não fazer nada de melhor para o município.
Lembro-me de prefeitos que
forçaram loteamentos para abrir novos bairros, com a justificativa de expandir
a cidade e atender ao crescimento populacional. Vi também ruas sendo abertas
para dar acesso a essas áreas recém-criadas, mudando a geografia urbana e
oferecendo oportunidades para novas moradias e empregos. Houve ainda prefeito
que buscou recursos junto ao BNH (Banco Nacional da Habitação) para construir
casas em bairros, garantindo o sonho da casa própria a muitas famílias. Outros,
em épocas distintas, se empenharam em trazer a COHAB (Companhia de Habitação),
reforçando o mesmo objetivo: proporcionar moradia digna e acessível.
Também presenciei gestões que
investiram em comunicação, adquirindo emissora de rádio para o município, com o
intuito de aproximar a população das informações de interesse público. Em outra
época, ruas foram calçadas com paralelepípedos, melhorando a trafegabilidade e
a qualidade de vida dos moradores. Teve prefeito que lutou pela vinda da
companhia de abastecimento de água, uma conquista essencial para a saúde e o
bem-estar de toda a comunidade. Praças públicas foram embelezadas com
calçamento em pedrinhas portuguesas, que, além da estética, trouxeram um charme
especial ao ambiente urbano.
Não posso deixar de citar as
construções de grande importância social e administrativa: escolas, para
garantir a educação das crianças e jovens; os Paços Municipal, como sede do
poder público e símbolo da organização administrativa; o pronto-socorro,
fundamental no atendimento de emergências de saúde; o fórum velho e novo, a Delegacia trazendo mais segurança e ordem
para a cidade , não por menos a e a Câmara, enfim por nossa pequena cidade
passou prefeitos do bem, como também os imbecis que visaram somente seu
propósitos.
Também presenciei mudanças
importantes na infraestrutura básica. Antes, os postes de iluminação pública
eram baixos e de madeira, o que limitava a eficiência e a durabilidade do
serviço. Com o passar do tempo, esses postes foram substituídos por estruturas
mais altas e, posteriormente, por postes de concreto, muito mais resistentes e
adequados às necessidades modernas da cidade.
Houve também prefeito que
decidiu mudar a escola de local, alegando que no terreno antigo deveria ser
construída uma rodovia. Essa troca, embora vista por alguns como progresso,
gerou muitas discussões, pois a educação sempre foi considerada pilar fundamental
do desenvolvimento social, mas a escola continua de pé, como a rodoviária
também.
Vi prefeito que construiu
equipamentos para os dois extremos da vida de um ser humano: o pronto-socorro,
voltado ao início e à preservação da vida, e o velório, destinado ao momento da
despedida. Em outra gestão, surgiu a iniciativa de erguer quadras de esportes,
incentivando a prática de atividades físicas e oferecendo lazer à juventude.
Também não faltaram em algumas épocas investimentos nas estradas rurais,
algumas abertas em locais tão difíceis que nem mesmo os animais silvestres,
como o tatu, conseguiam atravessar, houve prefeito que manteve as praças bem
cuidadas, com fonte, coreto, com flores de espécies dando inveja as demais da
região. Passou prefeito que desviou o trânsito vindo de outras cidades que
transitava pelo centro da cidade desviando por avenida, sem pensar no futuro e
na evolução do plantio e turismo local.
Houve prefeitos que buscaram
promover o lazer coletivo por meio de festas de todos os tipos, movimentando a
economia e a cultura local. Mas, em contrapartida, também testemunhei a decisão
de tampar córregos inteiros, sufocando a passagem natural das enxurradas. O
resultado foram transtornos graves, com alagamentos e prejuízos para muitas
famílias.
Em outras épocas, prefeitos
observaram o desgaste da natureza e se preocuparam em repovoar a cidade com
árvores, lotando calçadas e avenidas de verde, proporcionando sombra, frescor e
melhor qualidade de vida para todos. Porém, infelizmente, também houve gestões
contrárias a esse espírito: prefeitos que arrancaram arvoredos pela raiz,
queimando-os em olarias sem piedade, sem amor; destruíram árvores frutíferas
das praças para dar espaço a festas dançantes, cadeiras e mesas; e que, ao
invés de preservar, optaram por eliminar o que fazia parte da identidade e da
memória da comunidade, esquecendo que a natureza cobra e a cobrança é de valor
muito alto que nem troco existe.
Vi prefeito encobrir as ruas de
paralelepípedos com asfalto, apagando uma relíquia histórica e um patrimônio
cultural do povo, e não teve um sequer a mostrar que é um erro, o asfalto dura pouco sempre tem que tapar
buracos. Essas pedras carregavam memórias de gerações e davam à cidade um
caráter único, que se perdeu em nome de uma “modernização” questionável.
Também não faltaram gestões
marcadas pela desorganização: prefeitos que iniciaram obras e depois
abandonaram tudo pela metade, deixando a população no prejuízo, ainda é visível
algumas; prefeitos que fecharam instituições importantes, como a cadeia, sem
oferecer alternativas à segurança pública e outras.
Alguns governantes, é verdade,
buscaram o bem-estar, mas se confundiram entre o público e o privado, comprando
lotes e casas, reformando seus próprios bens com materiais caríssimos, enquanto
a cidade sofria com carências básicas. Outros, por outro lado, passaram pelo
cargo sem nada realizar: não fizeram pela cidade, tampouco por si mesmos,
deixando projetos inacabados que haviam sido iniciados por administrações
anteriores.
Também existiram aqueles que
chegavam ao poder “metendo a sola”, destruindo o que havia, sem planejamento e
sem pensar no futuro. Cada ação deixava uma marca, positiva ou negativa, e cabe
à população avaliar o que foi avanço e o que foi retrocesso.
Se eu fosse relatar
detalhadamente tudo o que vi acontecer ao longo da minha vida, certamente daria
para escrever um livro. E talvez esse livro servisse não apenas como registro
histórico, mas como alerta: para que não se repitam os mesmos erros, em um
futuro vindouro, e para que cada administrador compreenda que governar não é
brincar de poder, mas sim cuidar com responsabilidade do bem comum.
Vi de tudo em minha pequena
cidade, mas o que jamais pensei presenciar, e muito menos ouvir falar, é que
até pessoas já falecidas pudessem “votar” e, de alguma forma, ajudar a eleger Presidente
da República, Governador, Deputados e até Senadores. Pode parecer piada, mas
não é: trata-se de uma realidade séria e preocupante, que fere a credibilidade
do processo democrático.
Sim, em nossa cidade até mortos
voltam para votar. E não é força de expressão. Pouco tempo atrás, durante as
eleições municipais para prefeito e vereadores, estávamos reunidos no Fórum
Municipal. Aquele encontro tinha como objetivo selar um acordo entre os
partidos sobre o que poderia ou não ser feito na campanha eleitoral, um pacto
de conduta para manter a lisura e a igualdade no pleito. No entanto, como
tantas vezes já ocorreu, esse acordo acabou sendo quebrado por alguns, que
preferiram agir de forma contrária ao combinado, e os magistrados nem verificou
os acontecidos, mas deixa quieto, tem um dito que o burro só empaca, porque não
foi domesticado o suficiente.
Continuando falando do morto que
vota: o mais grave, porém, aconteceu dentro daquela sala. Estávamos mais de
quarenta pessoas reunidas, entre representantes de partidos e autoridades, e
outros tantos na parte de fora da sala
vindo de outras cidades, quando surgiu
dentro da sala o comentário que chocou a todos. O candidato adversário à
prefeitura, diante do Juiz, dos que representa a lei eleitoral e de todos os
presentes, afirmou em voz alta e clara: que um farmacêutico
da cidade, já falecido, teria votado nas eleições de 2022. Não foi apenas um
boato jogado ao vento. Ele disse o nome do falecido sem meias palavras,
deixando todos espantados.
Questionado sobre como sabia de
tal fato, a resposta foi ainda mais surpreendente. Segundo ele, a informação
partiu diretamente do filho do próprio farmacêutico falecido, que teria
confirmado a irregularidade. A revelação,
feita em público e em ambiente oficial, deixou todos perplexos, pois expôs a
fragilidade de um sistema que deveria garantir a transparência e a legitimidade
do voto.
Se o que foi dito realmente
corresponde à verdade, trata-se de um escândalo de proporções graves, pois
coloca em dúvida não apenas uma eleição específica, mas todo o processo
democrático local. Afinal, se um cidadão já falecido pode “votar”, quem nos garante
que outros não tenham passado pela mesma situação? Quantos votos, de fato,
refletem a vontade real da população e quantos são fruto de fraudes, de
descuidos do sistema ou daqueles
mesários que estão frente as urnas? Fica uma pergunta no ar...
Caramba, ficamos todos sem
reação naquele instante. O país inteiro sempre ouviu falar que as urnas
eletrônicas brasileiras são invioláveis e as pessoas que trabalham no dia da
votação são honestas e escolhidas a dedo, como poderia então um morto votar? As
urnas trata-se de um projeto considerado maduro, com anos de existência e
reconhecido internacionalmente. A Justiça Eleitoral, ao longo do tempo, tem
organizado eleições seguras, rápidas e transparentes, servindo inclusive de
modelo e inspiração para muitos países do mundo.
E, de repente, em meio a esse
cenário de confiança, surge um candidato a prefeito e declara, sem hesitar, que
um falecido havia votado em nossa cidade. O mais intrigante é que o voto do
falecido ocorreu justamente no ano em que alguns grupos mais exaltados, sem
provas concretas, espalhavam dúvidas e teorias de fraude nas urnas eletrônicas.
Foi como jogar gasolina em uma fogueira que já estava acesa.
Naquele momento, todos esperávamos uma atitude firme do Juiz. Seria de se esperar que ele interrompesse o candidato imediatamente, exigindo provas sobre suas palavras ou, até mesmo, questionando se aquela pessoa teria condições de continuar concorrendo após uma acusação tão grave. Ali não era somente um comentário, comentários ou brincadeiras se faz em bares da vida ou em roda de quem não tem o que fazer. Contudo, nada aconteceu. O juiz limitou-se a pedir à secretaria que verificasse algo sobre o tal falecido. E ficou por isso mesmo: não se esclareceu se o morto realmente votou ou não. Ora bolas! Dentro de uma sala de um fórum praticamente o candidato estava fazendo uma denúncia, cabia se então das autoridades tomar providências e sem falha.
Essa omissão acabou soando como
uma verdadeira provocação à própria Justiça Eleitoral. A ausência de uma
resposta imediata deixou no ar uma dúvida incômoda, como se o silêncio fosse um
reconhecimento implícito de que poderiam existir falhas no sistema.
O impacto foi ainda maior do
lado de fora da sala porque, naquela ocasião, havia representantes de cidades
vizinhas aguardando sua vez para firmar os mesmos acordos de campanha. Ao
ouvirem a denúncia, um deles, surpreso, comentou em voz alta: — “Ora, se é
assim, parece mesmo que há tramoia nas urnas.”
Outro visitante, também de um
município próximo, reforçou a perplexidade: — “Impressionante, nunca pensei ver
isso. Se for verdade, então qualquer resultado pode ser manipulado.” O outro
diz: então não vale a pena concorrer, se já escolhe o ganhador, isso é fria.
Essas falas, ditas ali mesmo de
fora da sala, deixaram todos em silêncio. Minha cidade, que já havia visto de
tudo em sua história, somava agora mais um episódio curioso — e preocupante —
ao seu repertório. A situação era tão absurda que alguém chegou a ironizar:
talvez os candidatos que não aparecem muito bem nas pesquisas acabem vencendo
aqui não pela força do eleitorado vivo, mas porque, de alguma forma, estariam
“falando com os mortos”, e os falecidos resolveriam conceder o voto de triunfo aquém
é eleito.
Parece piada, mas é trágico.
Porque, se uma dúvida dessa natureza se instala, a confiança do povo no
processo eleitoral se abala. E sem confiança, a democracia perde sua essência.
A sorte é que somente estava no local os candidatos ao cargo de Prefeito e os
dirigentes de Partidos, por isso o comentário não se espalhou por toda a cidade,
creio que nas outras cidades vizinhas também, pois os presentes tanto de minha cidade, como
a dos vizinhos não anunciaram o acontecido.
É nesse ponto que precisamos
ampliar a reflexão. Todas as transformações políticas e administrativas pelas
quais nossa cidade passou, cada uma à sua maneira, marcaram épocas distintas e
revelaram o esforço contínuo de alguns gestores municipais em promover melhorias.
Muitas obras tiveram impacto positivo, outras foram questionáveis, mas, em
linhas gerais, cada ação contribuiu para moldar o que nossa cidade é hoje.
Mesmo iniciativas pequenas fazem parte de um processo coletivo de
desenvolvimento e deixam marcas que ultrapassam o tempo em que foram
realizadas.
Entretanto, não podemos olhar
apenas para ruas, praças, escolas ou prédios públicos. Há algo ainda mais
essencial: a confiança no processo democrático. De nada adianta termos obras
materiais se não tivermos a garantia de eleições limpas, justas e respeitadas.
O voto é a voz do povo, é o instrumento pelo qual cada cidadão exerce sua
soberania.
O episódio relatado, em que se
questionou até mesmo o voto de um falecido, deve servir como alerta. A
democracia não pode ser tratada com descaso ou ironia. Se já é grave quando o
voto de um cidadão vivo é desrespeitado ou manipulado, o que dizer de um voto
atribuído a quem já não está mais entre nós? Situações assim geram descrédito,
espalham desconfiança e abrem brechas perigosas para que a população
desacredite de todo o sistema eleitoral.
É preciso que a justiça trabalhe
afinco e que cada um de nós reflita sobre isso. Mais do que obras físicas,
precisamos de líderes de pessoas comprometidas com a verdade, com a ética e com
a transparência. Só assim será possível garantir que o futuro de nossa cidade —
e de nosso país — seja construído sobre bases sólidas, em que a vontade real do
povo seja respeitada e prevaleça acima de qualquer interesse particular ou de
manobras obscuras. Que a população jamais esqueça: a cidade se constrói com
tijolos, mas também — e sobretudo — com verdade, ética e responsabilidade.
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