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sábado, 8 de novembro de 2025

O Ciclo da Destruição e o Silêncio da Gestão Pública

 O Ciclo da Destruição e o Silêncio da Gestão Pública

Acabei de chegar à conclusão de que os políticos e gestores públicos, na prática, são todos iguais. Mudam apenas os rostos, os discursos e as promessas, mas o ideal que os move parece ser o mesmo: destruir, destruir e destruir, sem medir as consequências. Não importa o que esteja em jogo — patrimônio, história, saúde, ou o bem-estar da população — todos que passaram por nossa cidade, ao longo dos anos, mostraram-se apenas aproveitadores do cargo, preocupados em se beneficiar e deixar sua marca pessoal, não em servir ao povo.

Quando olho para trás e observo a trajetória da nossa cidade, que já soma mais de cento e trinta anos de existência, percebo o quanto poderíamos ter evoluído. Uma cidade com uma base tão sólida, com tanta história e potencial, já deveria ter se transformado em um exemplo de progresso — não em quantidade de habitantes, mas em qualidade de vida, infraestrutura, planejamento e desenvolvimento humano. Porém, o que se vê é o contrário: a estagnação e o retrocesso. Parece que nossos gestores nunca pensaram em construir algo duradouro; querem apenas deixar placas com seus nomes presos em obras visíveis, como se isso fosse símbolo de boa administração.

Para deixar o nome cravado em algum lugar, muitos fazem de tudo: derrubam o que já foi construído, reformam o que não precisa, pintam o que não está descascado e trocam o que ainda funciona. O resultado é desperdício de recursos públicos, destruição do que já estava pronto e a sensação de que tudo recomeça a cada mandato, como se o passado fosse sempre descartável. E o mais revoltante: de todos os que já passaram pela gestão da cidade, não há um sequer que se salve.

Num passado não tão distante, nossa cidade era simples, de pouco movimento, com limitações estruturais, é verdade. Mas o tempo trouxe avanços, tecnologias, recursos e conhecimento. O que faltou — e ainda falta — é planejamento e responsabilidade. Com visão de futuro, poderíamos ter evitado tantos desgastes desnecessários e priorizado o que realmente importa: a Saúde pública, por exemplo, o bem mais essencial de qualquer comunidade.

A saúde é um desafio em qualquer lugar, mas com a evolução que tivemos desde os anos 1960 até hoje, há soluções rápidas, seguras e viáveis. O que falta não é tecnologia, nem dinheiro — é gestão inteligente e vontade de fazer o certo. Enquanto gestores preferem criar dificuldades, o povo sofre com filas intermináveis, falta de atendimento, ausência de remédios e descaso. Em vez de permitir que particulares lucrem com o sofrimento de quem não pode pagar, o poder público deveria assumir um rumo diferente, criando um sistema de saúde municipal mais justo, transparente e eficiente.

Um exemplo claro de desorganização é o funcionamento conjunto — ou muito próximo — de hospitais particulares e prontos-socorros públicos. Essa mistura causa confusão, descontrole e indignação. Quando o hospital é privado e o pronto-socorro é municipal, surgem problemas sérios: mistura de pacientes do SUS com os de convênios e particulares, dificuldade para saber quem paga cada atendimento, conflito de responsabilidades entre prefeitura e hospital e caos na triagem e entrada dos pacientes.

E por trás dessa confusão, existe um jogo silencioso e perverso que poucos conhecem, mas que afeta diretamente o bolso do cidadão e a qualidade do atendimento. Em muitos hospitais conveniados, uma prática antiga e disfarçada vem se repetindo há anos: todos os pacientes que passam pelo pronto-socorro, independentemente de possuírem plano de saúde ou condições particulares, acabam sendo lançados como atendimentos custeados pelo SUS. Aqui deve acontecer o mesmo! Essa manobra, escondida entre papéis e burocracias, faz com que o Sistema Único de Saúde arque com despesas que, em tese, deveriam ser pagas pelos planos privados ou pelos próprios pacientes particulares.

O resultado é um desequilíbrio gritante. O SUS, que já sofre com falta de recursos, é sobrecarregado por custos que não lhe pertencem, enquanto o hospital ou o instituto beneficente responsável pela administração da unidade sai ganhando. A instituição, que se apresenta como “filantrópica”, multiplica seus lucros, aumenta seu patrimônio e ainda se promove como prestadora de serviço público exemplar. Por trás da fachada da “caridade” e da “assistência ao povo”, o que existe é uma estratégia financeira bem calculada: transferir a despesa para o sistema público e, ao mesmo tempo, acumular ganhos particulares. Os repasses feitos pelo SUS, muitas vezes em valores acima dos custos reais, tornam-se fonte constante de lucro e de poder, enquanto o atendimento à população continua precário e as filas crescem.

Enquanto isso, o cidadão comum, que acredita estar sendo atendido pelo plano que paga ou por um hospital beneficente comprometido com o social, na verdade se torna apenas mais um número usado para inflar relatórios e justificar verbas públicas. É um ciclo de vantagens para poucos e prejuízo para todos.

Dentro desse cenário corrompido por interesses e vícios antigos, um bom gestor, com senso de responsabilidade e coragem, poderia romper com esse ciclo de favorecimentos, desde que esteja disposto a enfrentar a resistência dos que se beneficiam do sistema. O primeiro passo seria expor o que está escondido. Denunciar de forma oficial e documentada as irregularidades nas cobranças indevidas ao SUS, mostrar publicamente os repasses recebidos, os gastos reais e os lucros obtidos pelas instituições que se dizem beneficentes. A transparência é a maior arma contra o abuso disfarçado de caridade. Quando a população entende para onde vai o dinheiro público, o discurso de “hospital filantrópico” perde o brilho e revela sua verdadeira face.

Um bom gestor não teme a fiscalização, ao contrário, ele a promove. Cria mecanismos para que cada centavo investido em saúde possa ser rastreado, desde a entrada do paciente até o pagamento final do procedimento. Implanta auditorias independentes, abre as contas à sociedade, valoriza os profissionais que trabalham com ética e corta privilégios disfarçados de “parcerias”. Com coragem, esse gestor pode ainda levar o caso aos órgãos de controle — Ministério Público, Controladoria-Geral, Tribunais de Contas —, exigindo que as verbas do SUS sejam aplicadas somente em atendimentos realmente públicos, e que os planos de saúde cumpram sua parte, pagando o que devem pelos atendimentos de seus segurados.

É um caminho difícil, solitário e perigoso, porque mexe com estruturas poderosas e antigas. Mas é também o único capaz de devolver à população o que lhe pertence: o direito de ser atendida com dignidade, sem ser usada como disfarce para enriquecer instituições que se alimentam do dinheiro público. Somente um gestor consciente, comprometido e disposto a enfrentar o sistema pode transformar essa realidade — e mostrar que a verdadeira filantropia não está em acumular bens, mas em servir o povo com honestidade e justiça.

A solução, no entanto, é simples: criar fluxos separados de atendimento. Deve-se dividir física e administrativamente o espaço e o atendimento, separando o pronto-socorro municipal, exclusivo para o SUS, das áreas de atendimento particular e convênios. As triagens precisam ser distintas, uma para o paciente SUS e outra para convênios ou particulares. O processo seria simples: perguntar se o paciente tem cartão SUS ou convênio e encaminhá-lo ao setor correto. O registro também deve ser separado em sistemas distintos: um para o SUS e outro para particulares, ou, se for um sistema único, com perfis independentes. Além disso, é essencial firmar um contrato ou convênio formal entre o município e o hospital, deixando claro quem paga os profissionais e materiais, como são feitas as transferências de pacientes e como são prestadas as contas à Secretaria de Saúde.

A comunicação com a população também é crucial. Devem ser colocados cartazes informativos, explicando onde se dirige cada tipo de atendimento. É uma questão de respeito, clareza e eficiência. Mas, infelizmente, o que se vê é exatamente o contrário.

A grande falha em nosso município está na ausência total de comunicação transparente entre a gestão da saúde e a população. Quando as pessoas não são informadas, criam suas próprias versões dos fatos — e com razão. O cidadão sente na pele a falta de atendimento, o atraso das consultas, o sumiço dos exames e a falta de remédio. E o pior: sente o silêncio das autoridades. Não comunicar é um erro gravíssimo. A falta de transparência gera revolta, boatos e desconfiança, e faz com que tudo pareça corrupção, mesmo quando não é. Os gestores trazem tudo às escondidas: consultas atrasadas, exames parados, medicamentos em falta, e quando o povo reclama — com toda a razão — chamam de exagero. Mas o povo fala porque sofre, porque vive o problema todos os dias.

A comunicação em saúde é tão importante quanto o próprio remédio. Informar bem é obrigação pública, não favor. Transparência ajuda a evitar boatos e falsas notícias, a explicar com clareza os motivos de atrasos, a mostrar o que está sendo feito, a valorizar os profissionais que realmente trabalham e a conquistar o apoio da comunidade em vez de apenas críticas. O setor de saúde deveria prestar contas regularmente — no mínimo uma vez por mês — informando à população quais medicamentos estão em falta, quais foram solicitados e quando chegam; as datas e locais de mutirões e exames; a quantidade de atendimentos, internações e procedimentos realizados; e os motivos claros e simples de eventuais atrasos ou falhas.

Essa transparência traria confiança, respeito e, principalmente, esperança. Mas, infelizmente, o que vemos é o contrário: segredo, desorganização e descaso. E por isso o povo fala, reclama e protesta — com toda razão. Em resumo, o que temos hoje é o reflexo de uma gestão que não pensa nas pessoas, mas nas aparências. Se houvesse compromisso verdadeiro, nossa cidade — com seus mais de 130 anos — já seria um exemplo de progresso. Mas enquanto a vaidade e o ego dos gestores forem maiores que o amor à cidade, continuaremos assistindo a esse ciclo de destruição e descuido, onde ninguém constrói, apenas destrói o que os outros fizeram.

 


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