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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Mariane, Moça do Trem.

Mariane, Moça do Trem
Sai do interior por volta de mil novecentos e setenta e quatro, lembro-me que era no mês da copa, e a hora em que eu descia a Rua Comendador rumo á rodoviária, percebi que havia muita gente festejando e soltando foguetes, pois o Brasil tinha ganhado aquele jogo.
Não me lembro qual foi o time que jogou com o Brasil naquele dia, sei que olhando o pessoal todo ali, eu desejei voltar para casa, já não mais queria ir embora do meu lugar.
Mas como tinha em mãos minha passagem de ida ate a cidade vizinha e era de onde eu também já havia comprado a passagem de trem para cidade de São Paulo capital.
Naquele tempo ainda existia trem de passageiros, hoje creio que nem mesmo os trens da companhia Votorantim existem mais, acho que agora eles transportam o cimento e cal somente em caminhões e carretas.



Continuei descendo a Rua Comendador um pouco triste por deixar minha terra natal, por outro lado tinha esperança de tanto ouvir falar que a capital dava muito emprego e com isso organizaria minha vida, poderia então ter um futuro pala frente.
Sempre fui um homem simples e muito acaipirado, pois nasci em uma roça e era muito acanhado, nunca fui de muita comunicação, se as pessoas puxassem uma prosa eu até que permanecia conversando.
Tomei o ônibus da aviação Nossa Senhora de Lurdes uma empresa muito antiga, seus ônibus ainda eram daqueles de bico, sentado naquele banco seguia olhando toda paisagem ao redor e como aquilo ficou gravado em minha memória.
Uns quarenta minutos mais ou menos gastavam a viagem, pois a estrada ainda era de terra, com isto havia muitos buracos e costelas de vacas, que fazia com que o ônibus vibrasse por todo ele, aquela viagem de vinte e seis quilômetros nunca terminava.
Por volta das seis e meia chegamos ao destino, desci  do ônibus na parada mais próxima da estação do trem e andei por uns cinco minutos mais ou menos até a entrada, onde havia uma roleta tipo cruz.
Ao atravessar a roleta deu-me uma tristeza profunda e comecei por ficar um pouco enjoado, como que se tivesse comido alguma coisa que estava estragado.
As duas malinhas tipo caixote naquele momento pesavam para uns cem quilos, arrastei-as até o banco e fiquei sentando, olhando para um lado e outro, foi então que sentou a meu lado um senhor de cor escura e me disse, esta indo para onde, meu rapaz?
Vou para a capital paulista.
Vai deixar tua terrinha de interior em busca de alguma vida melhor?
A, eu pretendo, aqui as coisa não estão bem!
Sabe meu rapaz eu moro perto de São Paulo e fui parar ali em mil novecentos e dez e vivo uma vida boa, mas não consegui muita coisa, tenho uma casinha, uma esposa e duas filhas e agora vivo pelo interior vendendo produtos para lavouras.
Com o que ganho sustento minha casa e minhas filhas nos estudos, por isso ainda vale a pena estar na luta, mas te digo tem que dar muita sorte para se sair bem.
Cinco para as vinte horas. o apito do trem soa, e ele vai  se encostando à estação, como minha passagem era de segunda classe eu não mais vi aquele senhor.
Ajeitei-me naquele banco duro, colocando uma das malas de encosto, para que eu pudesse colocar a cabeça, o trem da o apito e parte.
Ainda antes de sai da pequena cidade, eu ainda vi muitos festejando a vitoria do Brasil, ao sair da cidade começou ficar tudo escuro somente às luzes do trem dava o claro, eu havia levado um livrinho de bolso, comecei a ler.  Como aquela claridade não era forte o suficiente minhas vistas começou doerem então o guardei e me encostei-me à mala, quem sabe dormiria, pois a viagem era de doze horas.
Na próxima parada em outra cidadezinha entrou duas moças e um rapaz, uma das moças veio em minha direção procurando seu lugar, pois eram todos numerados e meu banco era o cinquenta e três e o dela cinquenta e dois, chegando perto a mim, disse.. Sei que você esta confortado, mas tenho que me sentar.
Pois não, levantei-me e tirei a mala do banco, ela devia de sentar do lado do corredor, mas pediu-me se dava para deixá-la sentar-se do lado da janela.
O que tinha demais, eu pensei, a viagem então prosseguiu, nem eu nem a moça tinhamos assunto.
Deveria ser umas vinte e duas horas quando o bilheteiro me chamou para mostrar-lhe a passagem, acho que tinha cochilado um pouco, dormir de fato ainda não, porque ainda era cedo para isso, entreguei-lhe a passagem e olhei para a moça que estava lendo uma revista.
Ela me olhou também e sorriu, foi então que percebi o tanto que aquela mora era bonita.
Ela também entregou a passagem para o bilheteiro que as picotou nos entregando indo para os passageiros da frente, depois de certa distancia em que ele já estava à moça percebendo que não ia escutá-la me disse.
Não sei para que isso se ao entrar-mos já mostramos a passagem, é só para acordar quem esta dormindo, você estava não estava?
Não sei acho que sim, passei por uma madorna.
 Você esta indo para ode?
Estou indo para São Paulo e você?
Eu também!
Você mora lá?
Agora sim, sou de Tambaú estou morando e trabalhando em São Paulo, você também mora lá.
Ainda não hoje é minha ida, quero arrumar um emprego e moradia.
A então você esta indo a caça de coisas melhores?
Pretendo!
Olha, se você quiser passo lhe o endereço de uma pensão perto de onde eu moro, foi o primeiro lugar que morei é de uma senhora muito boa e é barato.
A, quero sim, não tenho muito dinheiro mesmo e sei que no começo não vai ser fácil.
Com isso nossa conversa dourou praticamente toda a noite de viagem nem mais percebia o quanto estava ansioso, sei que lá pelas cinco horas da manhã eu e ela já estávamos nos garfando entre os dois bancos.
E que beijo a moça tinha, um calor dentro de mim percorria pelo corpo todo, se não fosse dentro daquele trem, creio que acontecia até mesmo sexo.
Talvez fosse porque eu nunca em minha vida havia namorado ou mesmo estar com uma mulher, com meus dezessete anos para dezoito eu era completamente virgem e ainda iria ficar por muito mais tempo pela frente.
Oito e vinte cinco daquela segunda feira do ano de mil novecentos e setenta, o trem apitava e parava na estação da luz em são Paulo aonde eu e aquela moça descemos e ela me ensinou o caminho para ir até a pensão da senhora Cleuza.
Como fui burro meu Deus não peguei o endereço da moça e nem o nome dela.
Chegando à pensão a senhora Cleuza me atendeu de uma forma encantadora.
Alojei-me no quarto destinado a mim e por sorte fiquei sozinho, pois ali tinha quarto de dois e três homens juntos.
O resto da segunda-feira eu passei por ali mesmo, descansei da viagem e na terça-feira sai bem cedinho procurando emprego, devia ser umas quatro horas da tarde quando em uma construtora arrumei serviço de servente e eu já ía começar no outro dia, estavam apertados com a entrega por isso contrataram-me.
Trabalhei o resto da semana, mas com aquele pensamento porque não perguntei o nome da moça e nem o endereço peguei, pois tinha encontrado dentro daquele trem a coisa mais bonita que já tinha visto e estado.
Trabalhei naquela construção por três meses e de lá acompanhei a firma para Osasco, onde iríamos construir uma tremenda mansão para o prefeito da época, então passei a morar dentro da obra, assim ficava um pouco mais barato e eu pensava em juntar dinheiro para que quando eu retornasse a minha cidade natal, poderia montar um negocio qualquer.
Mas, a coisa pior das quais eu iria fazer seria naquele sábado daquele ano, devia ser umas duas horas quando o companheiro de trabalho, por apelido de pistolinha me fez um convite, para ir - mos a noite em uma festinha de casamento na vila Prudente.
Como eu não saio nunca, então porque não ir, já fazia quase seis meses que estava fincado dentro do trabalho e nem a rua praticamente não via.
Chegamos por volta das vinte e uma horas na festa e estava um festão, muita bebida, muita musica uma grande animação, comecei por beber cerveja sem parar e depois tomei umas cubas, com isso peguei uma fagueira danada.
Como da vila prudente ate Osasco ao tinha ônibus para ir embora , lá pelas duas da madrugada chamei um taxi e pedi ao taxista para me deixar no centro, sei que desci na avenida São João e dali cheguei nem sei como ate um prédio naquele miolo de cidade, me lembro que foi ali naquele prédio de prostituição que deixei de ser virgem.
Nem sei como fui parar em meu quarto na obra, sei que acordei às quatro horas da tarde com uma ressaca e com a garganta como se tivesse engolido um sapo.
Na segunda perguntei ao meu companheiro de trabalho se fiz alguma coisa errada na festinha, ele disse que ate a hora em que ele estava por perto não.
Ainda bem, fiquei mais aliviado com o que ele me disse, pois dizem que quando se está bêbado demais a pessoa não raciocina direito.
E como eu não bebia nunca, poderia ter feito alguma coisa errada.
Durante mais dois meses e meio trabalhei ali em Osasco e depois fomos para o bairro Brás de São Paulo reformar um apartamento, sei que não podia ficar no apartamento por isso aluguei uma vaga ali perto, sempre juntando um pouco de dinheiro da sobra.
Pois minha idéia sempre foi que quando voltasse para minha cidade eu não ia mais trabalhar de empregado.
Sempre contei com isso!
Ali no Brás passei sair um pouco mais, principalmente dia de sábado, sempre dava umas voltas para tomar uma cervejinha.
No dia quatorze de maio, como era sábado; eu resolvi dar uma volta um pouco mais cedo no centro da cidade, pois sempre gostei de um bom filme e naquele sábado iria assistir o Vento Levou na Avenida São João.
Então sai a pé, pois não ficava tão longe assim e mesmo que quisesse tomar ônibus não dava certo, a maioria parava na Praça Dom Pedro e teria que andar do mesmo jeito.
Fui a pé mesmo e chegando a Praça da Sé avistei sentadas em um banco duas moças, eu notei que uma dela era a moça do trem, não me contive e me aproximei, e a minha surpresa foi grande, ela levantou se e me deu um beijo depois me apresentou a amiga.
Conversamos um pouco e disse que estava indo ao cinema e fiz o convite, ela me disse só se eu fosse levá-la em casa após o cine.
Como dizer não, pois eu estava tão feliz em reencontrá-la, sei que sua colega não quis ir ao cinema com a gente, ela disse que ira encontrar com seu namorado.
Foi uma das melhores passagens de minha vida aquele sábado, encontrei com a moça do trem e ainda iria assistir ao filme, como me senti feliz.
Durante o filme sei que nem prestei muito atenção no filme, somente anos depois é que foi assistir novamente na televisão foi então que entendi a história do filme.
Naquele dia praticamente estava somente encantado com o reencontro e nem liguei para o filme, não sei se com a moça do trem acontecia o mesmo, sei que ali travamos uma luta de beijos e caricias e neste dia então partimos dali para um hotel bem no centro da cidade e foi onde fiz minha melhor relação sexual ate hoje.
Fui levá-la em casa depois e com isso continuamos a nos encontrar sempre e passado mais de seis encontros foi que perguntei o nome da moça do trem e descobri que ela se chamava Mariane e também ela ficou sabendo do meu nome, foram grandes risadas, já estávamos praticamente sendo namorados e foi naquele encontro que nos apresentamos de verdade.
Antes não tivéssemos nos apresentados um para o outro, mais três encontros e em um sábado fui buscá-la e não mais encontrei, tinha se mudado e ninguém me soube dar noticias.
Mariane a moça do trem sumiu e eu voltei para minha vida de sempre, então comecei a ir a salão de forro ali mesmo no Brás e em outros,
Do Brás fui para a Mooca trabalhar e residir em um quarto de porão, sete meses se passou e em um sábado fui para o Som Brasil dançar e assistir o cantor Barros de Alencar.
Neste dia vi uma moça sentada em uma cadeira bem  próximo ao palco, mas como a claridade do ambiente era fraca não dei por conta que era a Mariane a moça do trem e nem percebi que ela estava grávida.
Eu e meu companheiro estávamos sentados em uma mesa bem no fundo do salão, pois ele dizia que se ficássemos no fundinho do salão era melhor para ficarmos com as garotas.
Aquele sábado estava difícil ate às duas e meia da madrugada eu ainda não tinha conseguido ninguém para ficar ou mesmo sentar a mesa conosco.
As três já para terminar o baile eu resolvi ir ao banheiro e como tinha que passar perto ao palco ia então dar d encontro com a moça do trem, minha surpresa era mesmo Mariani e ainda grávida, cumprimentei-a.
Ia saído, quando ela me disse você não me conhece mais, bem o que poderia dizer, vi você sentada com seus amigos e achei que esta casada por isso eu não cheguei.
Mandou me sentar, dizendo que queria falar comigo.
Sentei-me e perguntei você casou?
Não! E é por isso que quero falar com você.
Eu estava um pouco chumbado e não estava entendendo o que ela falava, alem do mais o som estava muito alto.
Sei que ela me disse que não tinha casado e estava grávida de mim.
Achei aquilo uma coisa maluca na hora, estando tonto, nem liguei para o que disse, e ela me disse uma única coisa se você não quer não vai ter, levantou se, saindo, e eu voltei para minha mesa.
Fiquei em São Paulo por mais dois anos, continuei juntando a grana que pretendia trazer para minha terra quando voltasse.
No dia vinte e seis de setembro de mil novecentos e setenta e nove, sai do trabalho e fui ao largo da vila Prudente sacar minha poupança para que na segunda bem pela manhã eu voltasse para minha terra natal.
Depois de cinco anos trabalhando como burro de olaria, agora iria voltar e tentar montar o de meu.
Retirei o dinheiro do caixa e fui um pouco mais feliz para o porão onde morava como ia viajar na segunda pela manhã já tinha comunicado com o senhor dono do quarto que era até no domingo que iria ficar ali.
Como que para uma despedida da capital, sábado fui comprar alguns presentes para trazer, então deixei o restante do dinheiro na mala já pronta para viagem.
Comprei o que tinha de comprar e deixei um restinho de dinheiro no bolso, chegando a casa foi minha tristeza, entraram lá e arrebentaram minha mala e levaram todos meus cinco anos de trabalho e suor.
Ainda mais triste fiquei, mas como havia prometido a mim mesmo que não mais iria ficar ali em São Paulo na segunda parti para minha terra.
E desde então estou até hoje, mas sempre me lembro de tudo que aconteceu, fico imaginando se não seria melhor eu ter assumido a criança daquela barriga da única mulher que amei.
Depois dos fatos acontecidos nunca mais dei sorte na vida, estou agora com uma idade já avançada e nem mesmo uma casa pra terminar meus fins de dias tenho.
E como gostaria de saber a verdade, se aquela criança que estava para nascer era meu mesmo, como fui infeliz depois daquele sábado, que Mariani a moça do trem me disse que ia ser pai e não arquei com a responsabilidade de um homem.
Naquele tempo não tinha DNA, mas poderia ao menos acreditar naquela mulher que fui minha única paixão, meu único amor.
Era muito jovem por isso acho que não quis arcar com o que me foi dito, ainda mais que estava bêbado como gambá, porque não tentei procurá-la no outro dia, minha felicidade ficou dentro daquele clube.
Minha vida poderia ter mudado tomado outro rumo, mas por Deus eu não quis ferir ninguém em toda minha vida, agora sei, em toda minha vida creio que fui uma bagaceira, fui o verdadeiro fracasso.
Pego minha imagem de jovem em meus pensamentos e faz com que eu me sinta o pior dos homens.
Como queria que o passado voltasse para que eu tomasse outro sentido na vida e não mais viver com este sentimento de culpa, culpa que me faz tanto sofrer. 


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